o neurologista doutor Romaneli, do HBH, fala sobre as pesquisas de HTLV

O vírus HTLV (sigla da língua inglesa que indica “vírus que infecta células T humanas”) é um retrovírus isolado em 1980, a partir de um paciente com um tipo raro de leucemia de células T. Apresenta dois tipos: o HTLV-1, que está implicado em doença neurológica e leucemia, e o tipo 2 (HTLV-2), que está pouco evidenciado como causa de doença. Desde 1997, com a criação do Grupo Interdisciplinar de Pesquisas em HTLV (GIPH), a Fundação Hemominas desenvolve pesquisas sobre o vírus linfotrópico de células T humanas tipo 1 (HTLV-1), visando a ampliar o conhecimento a respeito e, dessa forma, contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos afetados por ele.

Formado com o apoio e participação de profissionais de várias instituições (Fundação Hemominas, UFMG, Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação, Instituto René Rachou, entre outras, ao longo do tempo), o objetivo inicial do GIPH foi o de estudar a história natural, as manifestações clínicas e aspectos epidemiológicos da infecção pelo vírus linfotrópico de células T-humanas tipo 1 e 2 em ex-doadores de sangue da Fundação Hemominas.

É o que explica o neurologista e pesquisador Luiz Cláudio Ferreira Romanelli, do Hemocentro de Belo Horizonte (HBH): “Era um vírus pouco conhecido na época, relacionado a duas doenças graves: leucemia de células T do adulto (ATL) e a mielopatia associada ao HTLV-1/paraparesia espástica tropical (HAM/TSP). Durante os anos de seguimento da coorte, o GIPH e as demais instituições contribuíram para o desenvolvimento do conhecimento na área em nível nacional e internacional, com várias publicações científicas, além de prestar assistência aos indivíduos infectados, na ausência de serviço de referência para o atendimento desta população”.

Ainda, segundo Romanelli, “inicialmente acreditava-se que a infecção pelo HTLV era de baixa morbidade, mas o acompanhamento e estudos realizados durante os 20 anos de seguimento da coorte GIPH demonstraram que, além das duas doenças inicialmente associadas ao vírus (ATL e HAM/TSP), o indivíduo infectado pelo HTLV pode apresentar inúmeros sinais, sintomas e outras doenças ao longo do curso da infecção em diversas áreas como dermatologia, neurologia, oftalmologia, otorrinolaringologia, psiquiatria, pneumologia, oncologia e urologia, o que leva a uma mudança de paradigma com relação à infecção pelo HTLV”, esclarece.

Transmissão

A maioria dos indivíduos infectados pelo HTLV encontra-se assintomática ou apresenta sintomas que, na maioria das vezes, não são associados à infecção. Como ressalta o pesquisador, a maior parte desconhece o estado de portador do vírus, até que surjam sintomas que levem à suspeita clínica da infecção e realização de exames laboratoriais específicos para o diagnóstico. Enquanto isso, o portador assintomático pode transmitir o vírus por via sexual, vertical (de mãe para filho na gestação, parto e lactação), compartilhamento de agulhas entre usuários de drogas ou tatuagem, além de acidentes biológicos e outras vias.

O controle rigoroso e os testes sorológicos realizados nos doadores de sangue desde 1993 contribuíram para a redução da transmissão através dos produtos hemoderivados. “Infelizmente, o exame sorológico para o HTLV não tem sido realizado de forma sistemática durante o pré-natal, o que poderia prevenir a transmissão e perpetuação da infecção em famílias por várias gerações, com suspensão do aleitamento e cuidados durante o parto”, lamenta o doutor Romanelli.

Pesquisas avançam

Embora, até o momento, não tenham sido identificados marcadores robustos que possam ajudar a reconhecer os indivíduos infectados que desenvolverão alguma das doenças associadas ao HTLV, os estudos seguem adiante: “O GIPH, nos últimos anos, tem investigado essa associação por meio do uso de várias tecnologias, em diversas áreas, como avaliação da resposta imunológica (carga proviral, citocinas e quimiocinas), metabolismo dos tecidos comprometidos (PET) e estudos neurofisiológicos para detecção precoce do comprometimento do SNC (VEMP, P 300, potenciais evocados). Além disso, ainda não possuímos um tratamento específico eficaz para controlar a infecção e as doenças associadas. Na atualidade, os profissionais atuam principalmente com tratamentos para os sintomas, com o objetivo de reduzir o impacto da doença na qualidade de vida dos pacientes. Pesquisadores do GIPH (ICB-UFMG) têm desenvolvido uma vacina terapêutica, que possa contribuir para que o nosso sistema imunológico possa combater o vírus”, informa o pesquisador.

O GIPH completou 20 anos de seguimento da coorte em 2017, iniciando uma nova coorte de pacientes. “A grande maioria dos portadores assintomáticos e doentes da coorte GIPH foram encaminhados para os centros de referência de atendimento ao HTLV no Hospital Eduardo de Menezes (FHEMIG) e no Ambulatório Orestes Diniz (UFMG). O GIPH continua com atendimento de orientação e encaminhamento aos centros de referência aos voluntários doadores de sangue inaptos devido a infecção pelo HTLV e seguindo uma coorte fechada de aproximadamente 100 indivíduos infectados pelo HTLV-1, assintomáticos e portadores de HAM/TSP. Avaliar o impacto da infecção crônica pelo HTLV-1 durante a senescência é um dos objetivos em pauta”, conclui Romanelli.

Conforme acentuam organizações ligadas ao estudo do HTLV, “esse vírus, de abrangência mundial, ainda passa despercebido pela maioria da população, por alguns profissionais e gestores da saúde; diante disso, precisa ser devidamente discutido para que, no Brasil, se defina todo o impacto dessa infecção e confira às pessoas que com ela convive o devido atendimento e uma melhora sensível na qualidade de suas vidas.”

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