Pacientes infantis de doença falciforme em atividades monitoradas no HBH - Fotos: Adair Gomez

Centro de referência no estado para o tratamento hematológico das hemoglobinopatias, das quais a doença falciforme é a mais frequente em Minas Gerais, a Fundação Hemominas acompanha mais de sete mil pacientes em suas unidades.

Segundo a coordenadora dos ambulatórios da Fundação, doutora Patrícia Cardoso, a Doença Falciforme (DF) é um grupo de desordens genéticas cujas manifestações, além de anemia hemolítica de grau variável, incluem diversos eventos agudos, tais como, crises vaso-oclusivas e lesões progressivas em múltiplos órgãos, que acarretam grande morbimortalidade. Ela esclarece que vários fatores estão intimamente interligados à letalidade, como moduladores genéticos, fatores ambientais, e socioeconômicos, assim como a disponibilidade de assistência médica.

“A doença falciforme é a anemia hemolítica congênita mais comum no Brasil e no mundo, e o reconhecimento de sua prevalência no nosso país foi determinante na instituição da Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme (PNAIPDF) do Ministério da Saúde. Estima-se que 4% da população brasileira tenha o traço falciforme e que de 25 mil a 50 mil pessoas tenham a doença em estado homozigótico (SS – anemia falciforme) ou na condição de heterozigotos compostos ou duplos (SC, SE, SD, SBetaTAL – doença falciforme). Atualmente, avalia-se que varie de 60 mil a 100 mil casos no Brasil”, informa a doutora.

Atendimento na Hemominas

Tudo começa com o teste do pezinho: o sangue do bebê, colhido até o quinto dia de vida nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), vai para o Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad), responsável por executar o Programa de Triagem Neonatal de Minas Gerais (PTN-MG). O exame mostra se o bebê possui alguma alteração que possa indicar o diagnóstico de uma doença de origem genética grave ou que se desenvolveu no período fetal (congênita). Uma das seis doenças triadas é a doença falciforme. Se o exame der alterado, o Nupad aciona a família que agenda uma primeira consulta nas unidades da Hemominas. Nos ambulatórios, os familiares são orientados quanto aos riscos e complicações, recebem relatório médico informando sobre a doença e suas principais complicações, além da prescrição de medicamentos fornecidos pelo SUS, como ácido fólico e antibióticos para evitar infecções, em geral. No ambulatório, a criança é acompanhada por uma equipe multiprofissional, que inclui médico hematologista, enfermagem, serviço social, psicologia, fisioterapia, ortopedia, neurologia, infectologia, odontologia, pedagogia e farmacêuticos.

As unidades da Fundação acompanham os pacientes em caráter ambulatorial, por agendamento, mas o atendimento de intercorrências agudas  daqueles afetados pela doença deve ser feito em unidades de prontoatendimento (UPAS) e hospitais de referência. Além disso, tais pacientes devem estar vinculados à UBS de referência e inseridos nos programas de saúde, garantindo o seu atendimento integral. Para esclarecimento de dúvidas e ou discussão de caso, há plantão presencial nos horários de atendimentos das unidades da Fundação. Após esse período, há um plantão de sobreaviso, por telefone, para orientações: caso o médico que esteja atendendo o paciente queira esclarecimentos sobre o quadro clínico dele, o contato pode ser feito via LigMinas 155 – opção 1 (ligação gratuita – 24h).

Quanto mais cedo o paciente e familiares se atentarem quanto à importância do autocuidado, da alimentação balanceada, vacinações, hidratação oral frequente, uso de analgésicos em caso de início de dores leves, de evitar extremos de temperatura e de usar calçados confortáveis para não causar lesões nas pernas, melhor a qualidade de vida.  E é fundamental que todos os envolvidos - pacientes, familiares e educadores – estejam atentos a casos de febre, dores moderadas a intensas ou outras complicações que exijam o encaminhamento para a urgência.

As unidades da Hemominas que fazem o controle hematológico de pacientes com a Doença Falciforme são os Hemocentros de Belo Horizonte (HBH), Juiz de Fora, Montes Claros, Governador Valadares, Uberaba,Uberlândia e os Hemonúcleos de Divinópolis, Sete Lagoas, Diamantina, Patos de Minas e Manhuaçu.

/doutora Patricia Cardoso, do HBH, em entrevista sobre a doença Falciforme
Dra. Patrícia Cardoso: prevenção e autocuidado para assegurar melhor qualidade de vida - Fotos: Adair Gomez

Tratamento de emergências/urgências

Como salienta a doutora Patrícia, grande parte dos pacientes com a doença falciforme podem apresentar complicações graves e com risco de vida em faixa etária bem jovem, como infecções, sequestro esplênico em crianças e síndrome torácica aguda, principal causa de óbito em adultos jovens. “Devido à elevada morbimortalidade em pacientes jovens, faz-se necessário o encaminhamento emergencial a hospitais de nível terciário que apresentem recursos adequados para atender às principais complicações agudas e graves ameaçadoras de óbito. Entre eles, serviços de hemoterapia para transfusão de concentrados desleucocitados, fenotipados, testados para hemoglobina S, oferecidos pela Hemominas, realização de exsanguineotransfusões parciais e leitos de centro de terapia intensiva”, alerta. 

Outro fator que pode melhorar o quadro, defende a hematologista, é a prática de educação continuada e permanente para tratamento das complicações relacionadas à doença falciforme. Contribuições nesse sentido estão contidas nos Manuais Técnicos do Ministério da Saúde/ Fundação Hemominas, disponibilizados no site, e ainda o curso de EAD (Educação a distância) elaborado pela Fundação e Prodemge, dirigidos a profissionais de saúde para auxílio do treinamento em urgências em Doença Falciforme.

 Gestantes e puérperas com doença falciforme: pré-natal de alto risco           

Desde o início do Projeto Aninha (atendimento às gestantes com doença falciforme – Cehmob/Fundação Hemominas), em 2007, foi estabelecido um fluxo de atendimento às gestantes com doença falciforme e que foi integrado atualmente pelos hospitais especializados em acompanhar e tratar as complicações relacionadas à doença e gestação. Na avaliação da doutora Patrícia, uma referência é o Hospital Maternidade Odilon Bherens. “As gestantes devem ter acompanhamento regular conjunto no pré-natal de alto risco e Hemominas. É essencial reconhecer precocemente as principais complicações relacionadas à doença, como infecções e síndrome torácica aguda. O tratamento precoce e a realização de exsanguíneotransfusão parcial pode salvar a vida de muitas pacientes”, relata. A esse respeito, ela lembra que qualquer hospital que quiser se capacitar na realização desses procedimentos pode contar com a Fundação para realizar o treinamento ambulatorial dos profissionais e equipe de enfermagem.

Quanto à COVID-19, a hematologista ressalta que o vírus apresenta grande risco para pacientes com doença falciforme devido a uma diminuição em sua imunidade, maior risco de infecções, pneumonia/síndrome torácica aguda e disfunções orgânicas provocadas pela vaso-oclusão. Os seguintes sintomas podem se desenvolver nos 14 dias após a exposição a alguém com infecção por COVID-19: tosse ou dificuldade em respirar (dispneia) ou dor torácica ou febre. Por isso, qualquer paciente com doença falciforme deverá ter atendimento preferencial, com avaliação clínica criteriosa.

E o próprio paciente tem de se cuidar: “Orientamos aqueles com doença falciforme a manter as recomendações universais de prevenção pela infecção pela COVID-19:uso de máscaras, lavagem de mãos e ou uso de álcool gel, evitar aglomerações e sair de casa, se estritamente necessário.

E mais: manter consultas conforme seu quadro clínico e orientação de seu médico, e em caso de febre, qualquer sintoma respiratório e outros sinais/sintomas de alerta como prostração, desidratação acentuação da palidez e icterícia, aumento súbito do tamanho do baço, distensão abdominal, alterações neurológicos e convulsão, vômitos e inapetência, dor moderada a intensa sem alívio com analgésicos, sintomas e dificuldades respiratórios, priapismo em adolescentes e homens, por mais de 2 horas, a indicação é procurar o serviço médico de urgência. Pacientes que recebem transfusões crônicas nos Hemocentros, controle de Hidroxiureia e gestantes deverão manter as consultas agendadas.

Pacientes infantis em confraternização de fim de ano no HBH - Foto: Adair Gomez
Confraternização de fim de ano com pacientes infantis e adultos no HBH - Fotos: Adair Gomez

Qualidade de vida

A DF não é sinônimo de inatividade: desde que bem assistidos e cuidadosos com a própria condição e saúde, os pacientes devem ser encorajados a praticar atividades específicas e a estudar, a fim de conseguirem uma profissão no futuro, divulgando mais sobre a doença falciforme no ambiente escolar e, assim, garantir educação adequada.

Na avaliação da doutora Patrícia, a expectativa de vida dos pacientes com doença falciforme no estado melhorou muito devido aos cuidados preventivos e tratamento especializado na Hemominas. Para evitar o AVC isquêmico nas crianças de 2 a 18 anos com anemia falciforme, a Fundação dispõe de exames como o Ecodoppler transcraniano, em algumas de suas unidades, para verificar pacientes com riscos dessa complicação, tratando-os com transfusões crônicas, uso de Hidroxiureia. Já o transplante de medula óssea está indicado em pacientes com doença mais grave, conforme portaria vigente do Ministério da Saúde, principalmente em caso de doença cerebrovascular, tendo doador aparentado compatível. “No futuro, teremos mais tratamentos disponíveis, incluindo outros medicamentos para diminuir a hemólise e vaso-oclusão, bem como a terapia gênica”, anima-se ela.

Gestor responsável: Assessoria de Comunicação Social