Dr. Paulo Rezende, hematologista da Fundação Hemominas e do Hospital das Clínicas defende tese sobre doença falciforme

Uma pesquisa para mapear a incidência de duas variantes menos conhecidas da doença falciforme - a HbSC e a HbSD - em Minas, a partir da avaliação de 480 crianças acompanhadas nas unidades da Hemominas em todo o estado, pode contribuir para a prevenção e atendimento precoce dos pacientes, reduzindo as chances de evolução clínica grave da doença e, assim, proporcionar melhor qualidade de vida a todos. Este o teor da tese de doutorado defendida pelo médico hematologista da Hemominas e Hospital das Clínicas, Dr. Paulo Rezende, na Faculdade de Medicina da UFMG, em setembro de 2016. Segundo ele, a HbSS (anemia falciforme) é a mais comum e a mais estudada. Sua tese, desenvolvida em duas etapas, teve como foco dois subtipos da doença falciforme – a segunda e terceira mais comuns: HbSC e o HbSD, transmitidas por herança genética.

Paulo Rezende explica o objetivo do estudo: “Os SC e SD têm interação menos intensa, pouco estudada, pouca dor. Este estudo, inédito no Brasil e na América do Sul, responde a algumas questões, uma vez que não sabíamos o perfil da nossa população mineira, como nela se dá a manifestação clínica”. E mais: “Entendendo a história natural da doença, pode-se orientar melhor as famílias e profissionais envolvidos no cuidado de doenças”.

Resultados

Foram avaliadas 461 crianças SC, todas atendidas no Hemocentro de Belo Horizonte (HBH), e 19 SD, avaliadas nas demais unidades da Fundação no estado. Os SC - ocorrência de 1 caso para 3.300 crianças nascidas vivas; os SD - 1 por 171 mil nascidos vivos, menos comum. Entre os resultados apontados, observou-se que nos pacientes SD foram encontradas as variantes: 1) SD Punjab – em que o comportamento clínico de crianças é muito semelhante aos SS, apresentando maior gravidade; 2) SC Korle Bu (Gana, África), em que as crianças apresentam comportamento clínico semelhante aos indivíduos do traço falciforme. Rezende esclarece que traço falciforme não é doença e ocorre da seguinte forma: se uma pessoa receber somente um gene com a mutação, seja do pai ou da mãe, e o outro gene sem a mutação, ela nascerá somente com o traço falciforme, cujo portador raramente adoece e não precisa de tratamento especializado.

Já as crianças SC, de modo geral, têm menos crises de dor do que as SS, mas elas podem ser muito graves – 10% têm mais de uma crise por ano e podem ter os mesmos sintomas dos SS. Por isso, “além de se agregar novos métodos no atendimento aos pacientes de anemia falciforme na Hemominas, é importante mostrar aos pediatras que as crianças podem ter os mesmos sintomas dos que ocorrem nos SS (anemia falciforme), e claro que isso tem impacto na saúde pública”, ressalta o médico. A doença traz problemas de visão, retinopatia falciforme, uma ocorrência mais comum do que na forma SS. “Cuidados preventivos evitam complicações no futuro”, orienta ele.

A rotina do hematologista na Hemominas envolve consulta, avaliação clínica, prescrição de medicamentos e orientação sobre prevenção, complicações e sinais de alerta que indicam a necessidade de se levar o paciente ao serviço de urgência, o que reduz drasticamente a mortalidade.

A Fundação Hemominas disponibiliza alguns dos medicamentos essenciais para o tratamento das hemoglobinopatias e os componentes sanguíneos adequados, quando há necessidade de transfusão. Como o atendimento é eminentemente ambulatorial, os pacientes portadores dessas doenças, quando apresentam problemas clínicos e necessitam de atenção médica de urgência, devem procurar outros serviços da rede pública. Esses pacientes também são encaminhados à rede municipal de saúde para acompanhamento clínico de rotina e para realização de exames e avaliações de especialidades, tais como neurologia, oftalmologia, otorrinolaringologia, cardiologia, cirurgia pediátrica e ginecologia. Informações complementares podem ser obtidas nas unidades de atendimento.

Atenção multidisciplinar

Na Hemominas, o cuidado com o paciente falciforme estende-se às mães ou responsáveis, preocupados com dificuldades de aprendizagem e problemas de disciplina e que procuram o atendimento pedagógico para orientação. A primeira providência é saber se os pais já levaram informativos para a escola, orientando sobre as doenças e os cuidados que devem ser observados pelos profissionais de educação. Se não, o setor de pedagogia encaminha à direção da escola e aos professores cartas e a cartilha “Conhecer e compreender para educar”. Há escolas que solicitam orientação sobre a doença quanto aos pacientes do ambulatório. Cada doença tem uma carta específica (coagulopatias, hemoglobinopatias), de acordo com suas características. A doença falciforme e hemofilia têm cartas separadas para educação infantil e ensino regular, pois exigem cuidados diferenciados.

imagem da capa do informativo: Conhecer e compreender para educar: sobre as Hemoglobinopatias e Coagulopatias para a escolaOs doentes falciformes, por exemplo, devem evitar lugar abafado, muito frio, uma vez que a friagem pode provocar crises de dor que podem ocorrer em qualquer parte do corpo. Outros sintomas também devem ser observados: febre acima de 38 graus, palidez acentuada, vômito, desidratação. Falciformes precisam de mais hidratação e devem ser liberados para irem ao banheiro com maior frequência. A falta de água pode provocar crises de dor ou facilitar o aparecimento de outras complicações clínicas como o AVC.

Há outros tipos de intervenção como: solicitar o apoio do professor nas dificuldades das crianças, envolvendo até, se necessário, a Secretaria de Educação, o Conselho Tutelar e até instâncias superiores.  O setor orienta também quanto ao direito do paciente a transporte escolar e os procedimentos para consegui-lo; sobre mudança de escola para matricular o aluno numa unidade mais próxima de sua residência.

Entendendo a doença

Tudo começa com o teste do pezinho nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). O sangue do bebê vai para o Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad), responsável por executar o Programa de Triagem Neonatal de Minas Gerais (PTN-MG). O exame mostra se o bebê possui alguma alteração que possa indicar o diagnóstico de uma doença de origem genética grave ou que se desenvolveu no período fetal (congênita). Uma das seis doenças triadas é a doença falciforme. Se o exame der alterado, o Nupad aciona a família que agenda uma primeira consulta nas unidades da Hemominas. O teste do pezinho é oferecido gratuitamente à população dos 853 municípios de Minas, por meio do PTN-MG, sob a gestão da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG). Atualmente, são cerca de 5,5 milhões de recém-nascidos triados pelo PTN-MG, e mais de seis mil crianças/jovens em acompanhamento e tratamento para as doenças diagnosticadas (dados de setembro de 2016).

Uma das doenças genéticas e hereditárias mais comuns no Brasil, a doença falciforme afeta o formato das hemácias ou glóbulos vermelhos, que carregam a hemoglobina – pigmento responsável pelo transporte de oxigênio dos pulmões para o corpo. Quando isso acontece, a hemácia apresenta o aspecto de uma foice, daí o nome falciforme, dificultando a passagem do sangue pelos vasos e a oxigenação dos tecidos.

O tipo normal de hemoglobina é o AA. O tipo SS é o que indica a presença da doença falciforme, que segundo Paulo Rezende, provoca anemia, vaso-oclusão de pequenas veias e de artérias que podem ocorrer potencialmente em todas as partes do corpo. Quando a hemoglobina S se associa a outra hemoglobina variante, dá origem aos dois subtipos: hemoglobinopatia SC e hemoglobinopatia SD, que podem ou não apresentar manifestações clínicas. Segundo o médico, é um tratamento para a vida inteira. Uma forma de cura é o transplante de medula óssea, autorizado pelo Ministério da Saúde para formas mais graves, mas é um processo em andamento, necessita de regulamentação, implantação de fluxos etc.

Em parceria com o Nupad, a Hemominas faz treinamento a distância para os profissionais de saúde. Também pelo call center Cehmob – MG Atende – 0800 722 6500, com ligação gratuita 24 horas – profissionais de saúde podem discutir casos e receber orientação clínica. O canal atende ainda educadores, pacientes e familiares para esclarecimento de dúvidas.

Gestor responsável: Assessoria de Comunicação Social

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